Um pacato cidadão americano com sua modesta intenção de progredir na vida e atender as necessidades de sua família resolve comprar uma casa, afinal, já tinha dois filhos, havia ganho uma promoção no trabalho, trocou de carro duas vezes, este último tinha até aquecedor de bancos, e tinha até um cachorro, então agora ele daria um passo maior, compraria uma casa e finalmente teria seu próprio chão. Não precisaria mais pagar aluguél. Isto lhe daria um fôlego nas finanças. Não pagar aluguél, ter algo que é seu. O máximo!
Mas, este fôlego só existiria após terminar o empréstimo que ele teria que fazer, pois não tinha dinheiro para pagar a vista. Rumo ao banco! Gerente, senhor simpático, cafezinho, secretária atenciosa, poltrona confortável, ambiente climatizado. E finalmente o empréstimo. Como foi fácil, nem acreditou…teria a sua casa.
Grande, com um imenso pátio para as crianças e o cachorro “Mortgage”. Piscina. Seu salário estava um pouco apertado, mas no final de semana ainda daria para fazer umas compras no Mall (outlet é claro), nada de abusos.
E as necessidades foram levemente aumentando, um mp9 para sua filha, um curso de francês para seu filho, um laptop novo para sua esposa, que também já comprometera todo seu salário no mestrado numa caríssima Universidade. E assim foi, uma TV LCD para o quarto das crianças, celulares atuais, pois os velhos estavam fora de moda, uma cafeteira que faz capuccino, bolsas, tênis, sapatos, outro carro para a família, etc, etc, etc…a modernidade foi lhe empurrando novos gastos e consumos. Novo empréstimo, novos consumos. Mais um empréstimo, mais consumo. A casa apesar de não estar quitada, foi sendo sua garantia, o banco aceitava isto, não havia problema. O problema era pagar as prestações do empréstimo, cada vez mais alto e mais a despesa da casa. Mas como não faria isto? sua família pedia.
Não poderia ser taxado de “looser”, como diz a sociedade com síndrome de super-homem. Ninguém pode ser um “looser”, isto é o fim do poço para um homem.
Um cidadão brasileiro senta no sofá a noite e combina com seu filho que no dia seguinte irá comprar aquele tênis novo que ele tanto queria. O menino fica feliz. Ele, um mero operário de uma indústria que fabricava ônibus para exportação.
O banco refinanciava a casa do cidadão americano, fazia uma nova avaliação, colocando o valor um pouco mais alto, e esta diferença vinha à vista em forma de empréstimo. Pronto, tudo resolvido, empurra com a barriga e torcia para ninguém vê-lo conversando com o gerente. Até que o pior acontece, chegou ao fim da linha; Não havia mais como suportar as prestações, atrasou 1 mês, dois, três, quatro meses, no quinto mês, veio a ação de despejo. O banco lhe toma a casa. Foi morar de aluguel. Fim da ilusão de não ser perdedor. Agora ele era o legítimo perdedor. Mas estava aliviado sem as prestações.
– Crianças, sem celular novo ok? Fala o cidadão americano.
O banco então decide revender a casa, havia reavaliado tanto que jamais conseguiria vender por aquele preço. Claro o objetivo era o empréstimo, bancos vivem de empréstimos. Mas e agora, o cidadão não pagou o empréstimo, e o preço precisava cair, e o banco faria tudo novamente, cada cidadão com suas ilusões, sua família, seus filhos, seus cachorros. Mas tudo pura ilusão. O banco não suportou tantos empréstimos. O modelo de vencedor consumista estava desabando. O povo vivia de empréstimos, os bancos vivem de empréstimos, os cartões de crédito vivem de empréstimos. O mercado de tecnologia moderna vive de consumidores que vivem de empréstimo. Mas não havia como pagar todos estes empréstimos. O banco que investia trilhões na bolsa de valores para ganhar mais bilhões de lucro de um dia para o outro, simplesmente não tinha mais de onde tirar para investir, e aconteceu o pior.
Noticiou isto numa estação de rádio no sul do Alasca. Estação de rádio, esta que estava, por acaso, sendo ouvida pela internet por um economista na África do Sul. Que escrevia uma coluna para um jornal local.
As pessoas leram, um grande jornal leu, investigou e publicou. Um grande jornal americano não entendeu, mas foi investigar. Não precisava, a bolsa já havia caído. 7 pontos, a maior da história. Ninguém comprou ações, porque aquele grande banco não comprou naquele dia. E todos ficaram assustados. No dia seguinte outros bancos seguiram o mesmo exemplo, pois estavam com os mesmos problemas de empréstimos.
Aquele cidadão que decidira comprar o tênis para o filho, lê as notícias no jornal e pensa, resolve esperar mais uma semana para comprar. O dinheiro estava no banco. Sem problemas, só uma semana. Seu filho concorda.
A fábrica de tênis que tinha uma filial na Tailândia, precisava dos investimentos da bolsa. Precisavam manter as fábricas operando para justificar seus imensos lucros. E agora? Pensavam os donos da tradicional marca de tênis. O pai do garoto do tênis, assustado com as notícias, resolve não comprar o tênis, não sabia qual era o futuro daquela situação que estava vendo na TV.
Vamos ter que reduzir os custos. Diz o dono da famosa fábrica de tênis. As vendas estão caindo. Vamos cortar “gastos”, vamos demitir. E assim ocorreram na fábrica de TV LCD, de mp9, bolsas, sapatos, carros, aparelhos de café, etc, etc, etc.
A empresa de ônibus da Tailândia, onde fica a fábrica de tênis resolve não comprar ônibus novos que estava prevendo, pois o movimento havia caído, as fábricas retiraram alguns ônibus fretados, pois os empregados diminuíram. Não tinha necessidade de ônibus novos, pelo contrário negociariam alguns que sobraram no pátio.
A fábrica de ônibus diminui a produção, não havia necessidade de produzir tanto, afinal, a Tailândia o principal comprador, havia cancelado as encomendas. Vamos ter que reduzir os custos. Diz o dono da famosa fábrica de ônibus no Brasil. As vendas estão caindo. Vamos cortar “gastos”, vamos demitir.
E o pai do garoto perdeu seu emprego antes de comprar o tênis par seu filho. Mas não era um perdedor por isto. Seu filho entendera. E ele não tinha cartão de crédito. Era apenas um tênis.
– Pai, com o dinheiro que vc foi indenizado não podemos abrir uma fábrica de tênis. Meus colegas todos querem tênis.
Enquanto isto o país do tênis e do banco, pedem empréstimo para o Japão, sim aquele da Bomba Atômica. Será que irão pagar? Mas mesmo assim emprestaram o dinheiro. 150 trilhões de dólares para salvar a economia. Enquanto uns gastam e pedem empréstimos desenfreadamente, o Japão com sua sabedoria milenar economiza para os tempos difíceis.